A sustentabilidade na Mango é um compromisso a três tempos. Onde os objectivos ambientais e financeiros são medidos com base na ciência, para prosperar.
Por Sandra Dias
Fiz várias tentativas nos últimos quatro anos para entrevistar alguém da Mango que aceitasse responder a questões ligadas à sustentabilidade e só no início de 2022 é que consegui a tão desejada entrevista. Ainda não obtive todas as respostas às minhas perguntas mas saber que a Mango já tem um plano traçado e está a trabalhar para atingir as suas metas a curto, médio e longo prazo, marca pontos positivos.
Tive acesso ao seu relatório de sustentabilidade correspondente ao ano de 2020 mas quis saber mais. Beatriz Bayo, diretora de Responsabilidade Social e Corporativa (CSR), aceitou a entrevista e atualizou-nos com os números deste ano. Em 2018, quando comecei a formar o terramotto percebi que falar de sustentabilidade, em Portugal, não era visto como uma prioridade para as marcas de moda e de beleza. O assunto era irrelevante. Contudo, algumas marcas já começavam a incorporar cada vez mais esta palavra nas suas comunicações e nas suas intenções de estratégia produtiva.
A Mango foi uma das empresas que tinha um plano de sustentabilidade mas que muito timidamente falava deste aspecto. A sua primeira coleção Committed – pensada para ser feita com materiais de origem mais sustentável – foi lançada em 2017 e marcou o ponto de viragem da marca fundada em 1984. Assistíamos assim a uma nova fase em que a Mango se comprometia com as questões ambientais. Num momento em que o conceito de sustentabilidade ainda não era bem entendido pelas pessoas nem por muitas empresas.
Committed: o início do compromisso com o ambiente
Com a primeira coleção cápsula Committed, o foco da sua comunicação incidia nos detalhes da campanha fotográfica, nos materiais usados e no aspecto estético. Não falava abertamente de sustentabilidade, ou melhor, no plano de sustentabilidade da empresa. Talvez porque o próprio sector têxtil e da moda também estava a desbravar caminho nessa área.
A urgência de corrigir os danos da pegada ecológica da indústria da moda suplantava as outras dimensões da sustentabilidade. E algo tinha que ser iniciado para evitar danos maiores. Alterar toda a cadeia de fornecimento e de produção de marcas de moda com a escala da Mango que produz cerca de 126 milhões de artigos por ano, leva tempo, precisa de investimento e sobretudo de formação e assimilação de novos valores e de procedimentos.
Neste sentido, a coleção cápsula funcionava como um teste, à sua capacidade de entregar uma nova proposta de valor na forma de roupa e para auscultar a opinião pública face à moda mais sustentável. E de facto, as pessoas começaram a relacionar cada vez mais a indústria da Moda e Têxtil às alterações climáticas, à poluição dos oceanos e à perda de biodiversidade no planeta. Consequências da era do Antropoceno que revelam os enormes desafios desta indústria.
Fashion Pact: o planeta a curto, médio e longo prazo
Tempo, escala, responsabilidade, colaboração e estética, destacam-se como partes de uma equação que precisa ser resolvida, não apenas por uma mas por todas as empresas de todas as indústrias. Na sequência desta problemática e a pensar no planeta, o presidente francês Emmanuel Macron lançou o Fashion Pact durante a 45ª Cimeira do G7 que se realizou em agosto de 2019 em Biarritz, França. Para o qual designou François-Henri Pinault, presidente e CEO do grupo Kering como líder nesta missão.
O Fashion Pact resulta de uma coligação global de empresas da indústria da moda e têxtil (pronto-a-vestir, desporto, lifestyle e luxo), incluindo os seus fornecedores e distribuidores; todos comprometidos com um núcleo comum de objetivos ambientais em três áreas: mitigação das alterações climáticas, restauração da biodiversidade e proteção dos oceanos. Iniciativa que reuniu no seu início, sessenta signatários aos quais a Mango se juntaria um mês depois. Atualmente esta coligação representa 1/3 da indústria da moda global.
A Mango ao comprometer-se com o Fashion Pact e guiada pelos seus objectivos, com base na ciência, vai implementado cada vez mais transformações na sua estrutura interna. O que a levou a estabelecer quatro pilares de ação: 1) coleções sustentáveis; 2) biodiversidade e clima; 3) economia circular; 4) rastreabilidade e transparência. Para os quais definiu três prazos: curto até 2025, médio até 2030 e longo até 2050. Metas necessárias para manter o equilíbrio na sustentabilidade da empresa e nas suas coleções, sem agredir o planeta.
As datas estipuladas justificam-se em função da dimensão ambiental que apenas consegue apresentar resultados positivos nas futuras gerações ao passo que os aspectos social e económico estão vinculados a resultados atuais, que se revelam através do bem-estar, no presente. Em 2020 a Mango conseguiu aumentar a produção dos artigos Committed nas coleções para mais de 47 milhões, num total de 126.554.938 artigos (roupa e acessórios) anuais e ao mesmo tempo reduzir em 24% o consumo médio de água na produção de peças de ganga, que abrangem grande parte da sua produção.
Prosperidade ambiental e financeira interligadas
O resultado das boas práticas associadas à proteção ambiental está diretamente ligado à prosperidade financeira do grupo. Quer seja através de uma melhor gestão de recursos: água, energia e matérias primas, quer através de estratégias de financiamento. Este ano, a empresa assinou o seu primeiro acordo de financiamento relacionado com os critérios de ESG (environment, social and good corporate governance). Possibilitado apenas pelo desempenho positivo da sua estratégia de sustentabilidade.
Com isso, a Mango comprometeu-se em reduzir gradualmente as suas emissões de CO2 nas esfera de ação (scopes) 1 e 2. Definidas pelo Greenhouse Gas Protocol que classifica as emissões de gases de efeito estufa (GEE) das empresas em três esferas de ação (scopes). Em que a scope 1 representa as emissões diretas associadas à atividade da empresa. Tais como gás natural, combustão móvel, frota própria de veículos e gases refrigerantes (climatização) nos escritórios, armazéns e lojas próprias. A scope 2 abrange as emissões indiretas associadas ao consumo de energia da empresa – consumo de eletricidade nos escritórios, armazéns e lojas próprias. E por último, as emissões da scope 3 são todas as emissões indiretas (não incluídas na scope 2) que ocorrem na cadeia de valor da empresa.
Somente as scopes 1 e 2 são de relatório obrigatório. A scope 3 é voluntária e também a mais difícil de monitorar. No entanto, a Mango conta alcançar a médio prazo (até 2030) uma redução de 80% de GEE nas suas emissões diretas e indiretas (scopes 1 e 2) e uma redução de 35% nas emissões indiretas da scope 3. Esta medida, incluída num dos seus quatro pilares de ação, ‘biodiversidade e clima’, levou a empresa a juntar-se ao objectivo net zero para 2050, estabelecido pela Fashion Charter for Climate das Nações Unidas.
O cumprimento destes objectivos a par com a utilização de materiais cem por cento sustentáveis e de origem controlada – algodão, poliéster reciclado e fibras celulósicas – até 2025 beneficia a empresa com uma redução no custo deste crédito de 200 milhões de euros. Que em termos práticos se reflete na extensão do vencimento do empréstimo até 2028, aumentando ainda a disponibilidade de novas linhas de crédito.
A estabilidade e prosperidade financeira ajudam a reforçar o compromisso com o planeta, com a cadeia de valor e com a comunidade. Neste sentido, Committed to the planet, Committed to Community e Committed to the value Chain, refletem os valores da empresa que Beatriz Bayo nos explica em entrevista.